A Obra de Deus.

1 - O que E a Obra de Deus?

Leitura: "Prossigo para conquistar aquilo para o que também fui conquistado por Cristo Jesus. Irmãos, quanto a mim, não julgo havê-lo alcançado; mas uma coisa faço: esquecendo-me das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de mim estão, prossigo para o alvo,para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus" (Filipenses 3.12-14).

"E nós na qualidade de cooperadores com Ele" (2 Coríntios 6A).
Deus tem Sua obra. Essa não é a sua nem a minha obra, tampouco é a obra desta missão ou daquele grupo. É a obra do próprio Deus. Gênesis 1 nos diz que Deus trabalhou e, depois, descansou. No início, Deus criou a luz, os seres vivos, o homem e assim por diante. Ninguém, a não ser Ele, poderia realizar essa obra da criação. E hoje Ele tam­bém tem Sua obra, que não é a obra de homem algum e que homem algum pode fazer. A obra de Deus não pode ser feita por ninguém, a não ser pelo próprio Deus. Quanto mais cedo aprendermos isso, melhor, porque as obras, as idéias, os métodos, o zelo, a seriedade, os esforços e as atividades incansáveis do homem não têm qualquer lugar no que Deus está fazendo. O homem não pode ter mais parte na obra de Deus hoje do que poderia ter nos tempos remotos da criação.
Aos filipenses, Paulo diz: "Prossigo para conquistar aquilo para o que também fui conquistado por Cristo Jesus". O Senhor Jesus tem um propósito especial e específico ao nos alcançar, e é esse propósito específico que desejamos alcançar. Ele tem um propósito, e esse propósito é que ele nos ganhe a fim de sermos cooperadores, co-obreiros com Ele. Entretanto, ainda é verdade que não podemos fazer a obra de Deus, visto que toda ela é absoluta e totalmente Dele.
No entanto, nós somos Seus co-obreiros. De modo que, por um lado, devemos reconhecer que não podemos tocar, nem mesmo com o dedo mínimo, a obra de Deus e, por outro, somos chamados para ser co-obreiros com Ele! E foi com este fim que Ele nos alcançou. O Senhor tem um propósito definido na salvação - e um propósito claro e específico ao nos salvar -, que é nos ter como Seus co-obreiros.
O que, então, é a obra de Deus? Efésios nos mostra isso de forma mais clara que qualquer outro livro no Novo Testamento. O capítulo 1 diz: "Assim como nos escolheu Nele antes da fun­dação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante Ele" (v. 4); no capítulo 2 lemos: "Para mostrar, nos séculos vindouros, a suprema riqueza da Sua graça, em bondade para conosco, em Cristo Jesus" (v. 7). Lemos também no primeiro capítulo: "Desvendando-nos o mistério da Sua vontade, segun­do o Seu beneplácito que propusera em Cristo" (v. 9)
Em todas as reuniões da igreja freqüentemente há aqueles que se levantam e falam de acordo com sua própria mente. Eles não estão falando no Espírito, mas estão "fora do tom". O que dizem é de pouco ou nenhum valor. Mas na criação de Deus, conforme Ele determinou, não existe nada fora do tom.
Tudo é para o Filho, tudo vem de Cristo e para Cristo. Nada está fora Dele, pois Deus incluiu tudo em Cristo. "Nele foram criadas todas as coisas (...) Tudo foi criado por meio Dele e para Ele" (Cl 1.16). Tudo está em perfeita harmonia no plano de Deus. E Deus vai levar tudo em Sua criação a este nível e a este lugar de perfeita harmonia. Nesse sentido, não podemos fazer nada - Deus está fazendo tudo e tudo Ele fará.

QUEM É O CO-OBREIRO DE DEUS?
O co-obreiro de Deus é a Igreja. Em dois versículos de Efé­sios citados anteriormente temos um vislumbre das duas eter­nidades[1]: (1) "Nos escolheu Nele antes da fundação do mundo" e (2) "Para mostrar, nos séculos vindouros, a suprema riqueza da Sua graça, em bondade para conosco, em Cristo Jesus". E o nome do vaso por meio do qual isto é feito é "o Corpo de Cristo", que é o recipiente de Cristo.
Quem é, então, um co-obreiro de Deus? Bem, não é al­guém que deseja trabalhar para Deus, alguém que vê uma necessidade e deseja atendê-la; não é nem mesmo alguém que conduz pessoas à salvação; antes, é aquele que faz o que Deus lhe designou em Seu eterno propósito, e ele faz apenas isso. Se enxergarmos realmente aquilo para o que fomos conquistados por Cristo Jesus, todos os nossos labores, todas as nossas obras formais para Ele serão esmagados e feitos em pedaços.
O alvo e objetivo de Deus em tudo é revelar Seu Filho, manifestar Seu Filho, mostrar a suprema riqueza da Sua graça, em bondade para conosco, em Cristo Jesus. Este é Seu eterno propósito. Este é o objetivo que você tem na obra que está fazendo agora? Se for menos do que isso, então você não é um co-obreiro, um cooperador com Deus.
Você pode perguntar: "Como saberei se estou trabalhando junto com Deus?". Isso pode ser facilmente respondido. Você está satisfeito com o que está fazendo? Se você não satisfaz o coração de Deus, você mesmo não poderá se sentir satisfeito. Não se trata de comparar sua obra com a de qualquer outro. A questão é se tudo o que você realiza é bom, isto é, bom aos olhos de Deus, aceitável a Ele ou que procede Dele e é alinhado com Seu eterno propósito.
Paulo declara: "Prossigo para conquistar aquilo para o que também fui conquistado por Cristo Jesus". Não precisamos olhar ao redor e criticar os outros, desejando saber se é possível que todo o resto esteja errado e nós, poucos, estejamos certos. Isso não tem qualquer valor e é prejudicial. Não se incomode com os outros. Asseguremo-nos de nós mesmos estarmos pros­seguindo "para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus".

O QUE É A IGREJA?
Quando começamos a procurar aqui na terra por alguma coisa - uma igreja, um testemunho, um movimento, uma dou­trina, uma coisa exterior visível e tangível, descobrimos que ela se torna imediatamente mais outro "cristianismo técnico". E apenas uma coisa terrena, morta e sem utilidade. O Corpo de Cristo, entretanto, é vivo e espiritual. Mas quando está morto, se torna imediatamente apenas uma coisa.
Devemos ser simplesmente um grão de trigo que cai na terra e morre e produz muito fruto. Isso é seguidamente repetido através das eras. É um assunto sempre e para sempre celestial; nunca existe o toque da terra nele. A Igreja não é uma coleção de judeus, gentios, brasileiros, americanos, chineses e outros. Por acaso não está escrito em Colossenses: "O novo homem (...) no qual não pode haver grego nem judeu, circuncisão nem incircuncisão, bárbaro, cita, escravo, livre; porém Cristo é tudo em todos" (3.11)?
Muitos acham que o que nos permitirá cruzar os portões do céu é ter um pedaço de Cristo em nós. Esse é um conceito hor­rível, porque na entrada do céu está a cruz, e nesta cruz você e eu e todos os outros seres humanos fomos crucificados. Todo judeu, grego, brasileiro, americano, chinês, e qualquer outro, foi pregado naquela cruz e nunca chegará ao céu. Somente o que entra é Cristo; nada de nós jamais entrará. Isso é a Igreja. Qualquer coisa em nós e sobre nós que seja Cristo ou de Cristo é a Igreja; tudo o que em nós teve origem em nós - qualquer coisa que não seja o próprio Cristo em nós - não é a Igreja e nunca entrará no céu; pelo contrário, será destruído.
Aquilo em nós que é a vida sem mistura de Cristo é o que Deus eternamente reconhecerá e é com isso que Ele contará para trabalhar. E somente esse elemento é que poderá trabalhar junto com Deus.
2 - A Obra de Deus nesta Dispensação

Leitura: "A graça foi concedida a cada um de nós segundo a proporção do dom de Cristo (...) E Ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do Corpo de Cristo, até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilida­de, à medida da estatura da plenitude de Cristo, para que não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro. Mas, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo Na­quele que é a cabeça, Cristo, de quem todo o Corpo, bem ajustado e consolidado pelo auxílio de toda junta, segundo a justa cooperação de cada parte, efetua o seu próprio aumento para a edificação de si mesmo em amor" (Efésios 4-7, 11-16).

Vamos considerar agora o seguinte assunto: o que é a obra de Deus nesta dispensação? Encontramos a resposta na passa­gem de Efésios citada acima: a obra de Deus nesta dispensação é formar o Corpo de Cristo. E a obra da Igreja é exatamente a mesma, isto é, formar o Corpo de Cristo: "Todo o Corpo (...) efetua o seu aumento para a edificação de si mesmo em amor". Nenhuma missão, escola bíblica, grupo evangelístico ou coisa semelhante pode jamais tomar o lugar da Igreja ou fazer a obra da Igreja.

PARA O APERFEIÇOAMENTO DOS SANTOS
A típica Igreja de hoje está preocupada principalmente com a salvação de almas, mas no Novo Testamento, como em Efésios, não vemos isso. Cristo deu alguns para serem apóstolos, alguns para serem profetas, outros para serem evangelistas e outros para pastores e mestres. Por quê? Para o aperfeiçoamento dos santos. A principal preocupação da Igreja hoje parece ser salvar os homens do inferno, da punição, da dor e da perda. Isso é bom, mas não é o propósito de Deus para a Igreja. Não é Sua obra para a Igreja.
A tarefa que Ele designou para a Igreja é "o aperfeiçoamento dos santos", porque a obra de Deus e a obra da Igreja é a formação e edificação do Corpo. É-nos dito que, tendo em vista a encarnação do Senhor Jesus, Deus formou um Corpo para Ele, Cristo; mesmo assim, o Senhor Deus está também preparando um Corpo para Ele hoje. Os apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres são dados à Igreja para edificarem o Corpo, isto é, eles, como membros do Corpo, são para a edificação do Corpo. Os membros do Corpo são para o Corpo. Os dons para a Igreja, que são membros do Cor­po, são para o Corpo. O Corpo é para edificar o Corpo.

NÃO DOUTRINA, MAS VIDA
Pode a obra de Deus estar fora da Igreja em alguma missão, grupo evangelístico ou qualquer outro órgão? Nunca! Porque tem de ser a própria Igreja - o Corpo - que faz a obra do Corpo. Isso decide as considerações sobre obreiros ou missões independentes, grandes ou pequenas, notavelmente organiza­das ou motivadas pela fé. Se estão separadas do Corpo, estão separadas da ordem de Deus[2].
Isso não é um princípio ou doutrina, mas é uma questão de vida. Se você tiver revelação em relação a isso, então, no momento em que fizer a menor coisa individualista e não re­lacionada ao Corpo, você sentirá e saberá que está errado, mesmo sendo uma coisa pequena. Não existe absolutamente qualquer lugar para a independência ou individualismo, pois isto é o ego, isto é você, não é Cristo.
Você entende isso como doutrina? Se você não tem consci­ência do Corpo, então seu entendimento está na esfera mental e não lhe vem por revelação. Se for assim, é algo que você rece­beu de fora, não é algo que veio do interior. Não é espontâneo e não é vida para você. Pelo contrário, é algo em sua mente e não uma revelação; caso contrário, você teria consciência do Corpo. Se é algo que você pode jogar fora, de que pode livrar-se ou pôr de lado, então você não tem revelação sobre o Corpo.
Se você está realmente no Corpo, como uma experiência resultante de revelação, você não tem como se livrar dele. Você não tem outro caminho, não existe outra escolha - só existe um caminho para você.
Se você não seguir este caminho, não existe outro caminho para você, simplesmente porque você viu o Corpo por revela­ção. Se for revelação será algo interior, no seu espírito, e não algo exterior, em sua mente.
Fora da Igreja, que é o Corpo de Cristo, não há possibilidade de trabalhar para Deus. Se você for a um lugar onde existe uma igreja verdadeira, isto é, uma expressão do Corpo de Cristo que é realmente Sua igreja, você não pode trabalhar separado daquela igreja, isto é, não relacionado com ela. Não abrigue a idéia de que os apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres são os únicos obreiros que Deus estabeleceu no Corpo e para o Corpo. Realmente não são os únicos; cada membro do Corpo é designado por Deus para trabalhar para Deus e para o Corpo para a edificação do Corpo. Não é que alguns são obreiros e outros são simplesmente membros do Corpo. Todos são obreiros. O Corpo de Cristo deve edificar a si mesmo. Tudo deve vir do Corpo e tudo deve ser para o Corpo.
Não estamos aqui para estabelecer algo, para estabelecer uma "coisa", para sermos um modelo de culto, para represen­tar um novo movimento. Estamos aqui para representar uma expressão da vida de Cristo em Seu Corpo. Em Xangai[3], o que quer que seja do Senhor, quem quer que seja do Senhor, qualquer coisa e qualquer um que represente uma medida da vida de Cristo, nós os consideramos como pertencendo a nós. Eles são parte de nós, quer percebam ou reconheçam isso, quer não, e nós somos parte deles.
Se não for algo vivo, não é a Igreja. Uma coisa morta não pode ser Seu Corpo.
Geralmente o que mantém unida uma missão ou obra é um conjunto de doutrinas, algumas especiais, ou o próprio fundador, que pode ter sido um homem piedoso. Que o Senhor nos livre disso, pois tudo isso é morto. O Espírito Santo não pode apoiar tal coisa ou ministrar a ela, pois é uma "coisa", e o Espírito Santo só pode usar um organismo vivo: o Corpo, a Igreja. Toda obra deve sair da Igreja e toda obra deve ser para a Igreja, para a sua edificação.
O alvo de tudo o que mencionamos é encontrado em Efé­sios 4-13: "Até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à me­dida da estatura da plenitude de Cristo". Isso nunca poderá ser realizado individualmente; só pode ser realizado e alcançado como um Corpo. Portanto, pecamos a Deus para tratar conosco e cortar todo o individualismo, todo pensamento próprio, toda decisão própria e toda a ação e movimento individualistas. Nossa vida inteira deve ser vivida no Corpo. Pecamos ao Se­nhor para nos ensinar como viver no Corpo. A vida do Corpo não é algo que possamos estudar, mas é algo muitíssimo natural e espontâneo, se estamos no Corpo por revelação.
  
3 - Revelação do
Propósito Eterno de Deus

Leitura: "Disse o Senhor: Ocultarei a Abraão o que estou para fazer?" (Gênesis 18.17).
"Teve José um sonho e o relatou a seus irmãos (...) Teve ainda outro sonho e o referiu a seus irmãos" (Gênesis 375, 9).
"Chamou Jacó a seus filhos e disse: Ajuntai-vos, e eu vos farei saber o que vos há de acontecer nos dias vindouros" (Gênesis 49.1).
"Segundo tudo o que Eu [Deus] te mostrar [a Moisés] para modelo do tabernáculo e para modelo de todos os seus mó­veis, assim mesmo o fareis" (Êxodo 25.9).
"[Deus] e ensina aos mansos o Seu caminho. (...) A intimi­dade do Senhor é para os que O temem, aos quais Ele dará a conhecer a Sua aliança" (Salmos 25.9, 14).
"[Eu, Paulo,] jamais deixei de vos anunciar todo o desígnio de Deus" (Atos 20.27).
"[Eu, Paulo,] em nada considero a vida preciosa para mim mesmo, contanto que complete a minha carreira e o ministé­rio que recebi do Senhor Jesus para testemunhar o evangelho da graça de Deus" (Atos 20.24).
"Tendes ouvido a respeito da dispensação da graça de Deus a mim [Paulo] confiada para vós outros; pois, segundo uma revelação, me foi dado conhecer o mistério, conforme escrevi há pouco, resumidamente (...) do qual fui constituído mi­nistro conforme o dom da graça de Deus a mim concedida segundo a força operante do Seu poder" (Efésios 3.2, 3, 7).

O propósito eterno de Deus nunca pode ser entendido ou alcançado pela mente. Ele precisa ser revelado. Todo o serviço para Deus começa com consagração ou é baseado na entrega. Mas tal consagração ou entrega só vem por meio da revelação. Na verdade, a obra de Deus (não nossa obra, mas a obra de Deus através de nós) só começa quando há revelação. Exteriormente é a visão celestial; inte­riormente é a revelação.
Deus não quer que façamos uma espécie de trabalho ge­nérico ou uma miscelânea de obras para Ele. Ele deseja que conheçamos todo o Seu plano e trabalhemos com Ele em di­reção a um plano e propósito claros. Pois não somos apenas Seus servos, mas também Seus amigos (Jo 15:15).
Toda entrega e consagração é valiosa, mas, falando franca­mente, só depois da revelação é que a entrega e a consagração podem ser de muito valor, pois somente assim podem ser com­pletas. Nossa entrega antes dessa revelação só tem em vista a salvação. "Ele me comprou com Seu sangue, Seu amor por mim é indescritível. Por isso, devo dar a mim mesmo a Ele. Eu devo dar a mim mesmo e tudo o que tenho por causa do Seu amor e graça salvadora." Mas depois da revelação, isso é totalmente diferente. Quando vemos o eterno propósito de Deus, faz-se necessária uma tremenda entrega de nós mesmos para este propósito, com uma entrega que nunca antes sonhamos; algo mais profundo e absoluto. Paulo disse: "Não fui desobediente à visão celestial" (At 26.19). Ele podia passar por qualquer coisa e suportar tudo por causa da visão celestial.
José foi uma prefiguração perfeita do povo de Deus, reu­nindo em si mesmo todos aqueles que foram antes dele. Mas a crise veio para José quando ele teve seus sonhos. Isso foi sua revelação, na qual viu o propósito de Deus e sua própria parte nele. Isso foi o início da obra de Deus por meio dele. Moisés teve de subir ao cume do monte a fim de receber o padrão para a vida do povo de Deus: os Dez Mandamentos e toda a lei de Deus. Mais tarde, ele precisou obter o modelo do tabernáculo: "Vê que faças todas as coisas de acordo com o modelo que te foi mostrado no monte" (Hb 8.5).
A parte mais insignificante da obra que fazemos para Deus temos de fazê-la segundo o modelo a nós mostrado no monte, isto é, de acordo com a revelação que Deus nos deu do Seu pro­pósito e plano eternos. Mas a revelação que José, Moisés e outros tiveram foi individual. Mas não é assim hoje. Hoje a revelação é para a Igreja. Não é uma revelação diferente para cada indivíduo, mas a mesma revelação é dada para a Igreja inteira.

A OBRA ESPIRITUAL TEM COMO BASE A REVELAÇÃO
Toda obra espiritual para Deus surge da revelação. A parte da revelação do propósito eterno de Deus não pode haver verdadeira obra espiritual. Pode haver obra para Deus espalhada e misturada, e que é abençoada por Ele, mas não pode ser verdadeiramente chamada obra espiritual ou trabalho conjunto com Ele, a menos que surja da revelação quanto ao propósito eterno de Deus. Deve ser revelação e não apenas compreensão mental; entender e ver intelectualmente é de nenhum valor. É preciso ser um "ver" em seu espírito: ver qual é a esfera e limite da operação de Deus.
Somente a revelação pode tratar tanto com a obra como com o obreiro. Essa luz do céu nos esmaga e faz em pedaços a nós e à nossa obra. Se ela for mera doutrina ou ensino, ela nos deixará depois de algum tempo. Ela se vai, se evapora, por assim dizer. Mas se for luz ou revelação, ela é a nossa vida e não poderemos nos livrar dela.
Um dia o Senhor Jesus disse: "Quem comer a Minha carne e beber o Meu sangue tem a vida eterna, e Eu o ressuscitarei no último dia (...) Quem comer a Minha carne e beber o Meu sangue permanece em Mim, e Eu, nele. Assim como o Pai, que vive, Me enviou, e igualmente Eu vivo pelo Pai, também quem de Mim se alimenta por Mim viverá" (Jo 6.54, 56, 57). Muitos ficaram escandalizados com isso e O deixaram. Mas os discípulos, quando lhes perguntou se eles também O queriam deixar, responderam: "Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras de vida eterna" (v. 68).
Quando vemos a luz, ela se torna nossa vida, e não temos mais alternativa. Não temos outro caminho, pois é nossa pró­pria vida. Se não pudermos seguir aquele caminho, morremos. Mas, graças ao Senhor, não é algo que tenhamos de lembrar ou tentar recordar. Se vimos, vimos e sempre veremos. Nunca nos deixa. Descobrimos que o Corpo responde a tudo[4]: é nossa própria vida. Não podemos viver fora do Corpo.

A Quem Foi Revelado?
Cada item espiritual que possuímos chegou a nós através da revelação. Ele chega a nós nesta ordem: (1) luz, (2) revelação, (3) vida, isto é, a vida de Deus, (4) todas as riquezas Dele, tudo o que Ele é.
Se Deus quiser fazer uma coisa nova, algo especial, em Xangai, na China ou em qualquer outro lugar no mundo, Ele revelará isso a você ou esconderá de você? Quantos existem em Xangai nos quais Ele pode confiar caso decida fazer algo ali?
Tenhamos clareza de que é somente aos Seus amigos mais íntimos e queridos que o Senhor revelará Seus segredos e pla­nos. Isso deveria ser algo para todos nós considerarmos sole­nemente.

 4 - A Vida Edifica

Leitura: "A graça foi concedida a cada um de nós segundo a proporção do dom de Cristo. (...) E Ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do Corpo de Cristo, até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, a medida da estatura da plenitude de Cristo" (Efésios 4-7, 11-43).
"A manifestação do Espírito é concedida a cada um visando a um fim proveitoso. Porque a um é dada, mediante o Espírito, a palavra da sabedoria; e a outro, segundo o mesmo Espírito, a palavra do conhecimento; a outro, no mesmo Espírito, a fé; e a outro, no mesmo Espírito, dons de curar; a outro, operações de milagres; a outro, profecia; a outro, discernimento de espíritos; a um, variedade de línguas; e a outro, capacidade para interpretá-las. Mas um só e o mesmo Espírito realiza todas estas coisas, distribuindo-as, como lhe apraz, a cada um, individualmente (1 Coríntios 12.7-11).
"O que fala em outra língua a si mesmo se edifica, mas o que profetiza edifica a igreja. Eu quisera que vós todos falásseis em outras línguas; muito mais, porém, que profetizásseis; pois quem profetiza é superior ao que fala em outras línguas, salvo se as interpretar, para que a igreja receba edificação" (1 Coríntios 14:4, 5).
"Não que, por nós mesmos, sejamos capazes de pensar alguma coisa, como se partisse de nós; pelo contrário, a nossa suficiên­cia vem de Deus, o qual nos habilitou para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica" (2 Coríntios 3.5, 6).
"Tendo este ministério, segundo a misericórdia que nos foi feita, não desfalecemos (...) Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós. Em tudo somos atribulados, porém não angustia­dos; perplexos, porém não desanimados; perseguidos, porém não desamparados; abatidos, porém não destruídos; levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a Sua vida se manifeste em nosso corpo. Porque nós, que vivemos, somos sempre entregues à morte por causa de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste em nossa carne mortal. De modo que, em nós, opera a morte, mas, em vós, a vida" (2 Coríntios 4.1, 7-12).

Se não virmos o propósito eterno de Deus, nunca veremos qual é a obra de Deus. A obra inteira de Deus deve ser feita na Igreja e através da Igreja. Tal obra tem como alvo formar e edificar o Corpo de Cristo; esta obra deve ser feita por todo o Corpo e não apenas por indivíduos ou missões isoladas ou por atuações independentes da Igreja. Tal obra da Igreja deve vir inteiramente de Deus e ser para Seu Filho.
Para sermos co-obreiros com Deus devemos ter revelação, caso contrário não estaremos trabalhando em Seu propósito eterno e para Seu propósito eterno. O início de toda a obra para Deus é uma entrega e oferta de nós mesmos que aconteça como resultado da revelação. A razão pela qual é necessário que se tenha revelação é porque a luz de Deus mata tudo o que não vem Dele, tudo o que vem do homem. Quando a revelação chega, descobrimos que não há alternativa nem outro caminho para seguir. Ou seguimos este caminho ou morremos.


DUAS FORMAS DE EDIFICAR O CORPO
Como podemos ser co-obreiros com Deus e edificar o Cor­po? Se nossa obra é apenas salvar pessoas, o obreiro que estiver fazendo isso vai dar a impressão de estar realizando algo im­portante. Em certo sentido, vai parecer que é uma obra para o homem. Mas se nossa obra tem como propósito edificar o Corpo, então o homem está completamente cortado; porque o Corpo é Cristo. Tudo é para Cristo e, portanto, nada do homem pode entrar.
Em 1 Coríntios 12 temos o registro dos muitos dons do Es­pírito, e Paulo enfatiza tanto as palavras quanto os atos. Mas em 2 Coríntios 4 só temos atos. Existem duas formas diferentes de edificar a Igreja. Na verdade, qual é o valor desses dons do espírito na edificação da Igreja? O que é esse valor compara- do ao valor da vida no Espírito? Paulo, em 2 Coríntios, capítulos 3 a 10, enfatiza o que é o ministério da nova aliança. Esse minis­tério não está nos dons, mas na suprema grandeza do tesouro contido no vaso de barro, isto é, Cristo dentro dele.
Em 2 Coríntios lemos: "Levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a Sua vida se manifeste em nosso corpo. (...) De modo que, em nós, opera a morte, mas, em vós, a vida" (4.10, 12). Isso é totalmente diferente de Roma­nos 6, pois a idéia aqui é da contínua operação da morte. A morte de Cristo opera e continua operando dia a dia em nós, resultando na vida que flui para os outros. Assim a Igreja é edificada.
Aqui também temos duas maneiras pelas quais a Igreja é edificada: (a) em 1 Coríntios 12, pelos dons do Espírito; e (b) em 2 Coríntios 4, pela operação da morte em nós, para que a vida possa operar nos outros.
Qual das duas mais tem edificado você? Sua vida interior tem sido edificada mais pelos dons do Espírito ou por aqueles que você sabe que conhecem a aplicação da cruz na vida in­terior e levam sempre neles o morrer de Jesus para que a vida de Jesus seja manifestada? Isso é carregar a cruz. Que a morte nunca cesse de operar em você e em mim, para que também a vida nunca cesse de fluir para os outros.
Vemos pessoas ricas no uso dos dons: dom de cura, dom de expulsar demônios, dom de eloqüência ou de falar em línguas. E pensamos no quão ricas, abençoadas e usadas por Deus são tais pessoas. Mas isso é realmente assim? Estes são os dons da meninice. Eles são para o estágio de bebê, útil e necessário para aquele período, mas devemos crescer.
O que realmente edifica e mais ajuda não são os dons ou eloqüência daqueles que os possuem, mas a vida daqueles que conhecem profundamente a cruz, que a conhecem no íntimo e diariamente, e com os quais entramos em contato. Tome, por exemplo, um grupo de cristãos recém-salvos. Nos primeiros anos o Senhor pode lhes conceder dons, para que fiquem maravilhados com Seu poder e glória, e para fortalecer sua fraca fé. Mas uma vez que ela esteja suficientemente forte, Ele removerá os dons e trará a cruz. Existem graves perigos associados com os dons, e o maior deles é o orgulho espiritual. Alguém pode se levantar no Espírito (isto é, o Espírito derramado[5]) e pronunciar umas poucas frases maravilhosas que ninguém mais pode pronunciar. Então, ele pensa: "Sou mesmo importante!". Todavia, sua vida interior pode ser in­fantil comparada com outro crente que não tem os dons, mas conhece profundamente a cruz.
Deus concede soberanamente os dons a alguém aqui e ali para que possam servir como Seus porta-vozes por algum tempo, pois neste período nada mais será entendido porque são bebês, e Ele não tem como encontrar-nos em outro nível qualquer. Na verdade, Ele usará qualquer boca, até mesmo a de um jumento. Mas este c um ministério limitado, do tipo "jardim-de-infância", e é propenso à vaidade.
O que Deus realmente quer e está aguardando e traba­lhando para obter somos nós, os vasos nos quais as palavras dadas por Ele para as expressarmos sejam tomadas por Seu Espírito e entretecidas no mais íntimo do nosso ser pela cruz, até se tornarem nossa vida; somente então nosso ministério será de vida, vida que flui sempre da morte que opera em nós continuamente. Sendo assim, todos os que confiam nos dons são tolos, porque estes dons não mudam o homem interior. Uma igreja que procura se edificar por meio dos dons sempre acabará sendo uma igreja carnal, porque esta não é a forma de Deus para edificar a Igreja, a não ser no estágio da tenra infância2.

SEU MÉTODO É VIDA
O método de Deus é: vida e por meio da vida. Muitas vezes vamos a uma reunião e certo irmão sem cultura e iletrado ora ou se levanta e diz algumas palavras. Talvez o que ele fala não seja tão significativo, entretanto você se sente abençoado no mais íntimo do seu ser. "Um abismo chama outro abismo" (Sl 42.7). O que aconteceu é que você tocou a vida e, assim, foi edificado, fortalecido e ajudado. Aquele irmão ministrou vida a você.
Os cristãos que estão "inteiros" ou "intactos" nunca podem ministrar vida, pois apenas os que foram quebrados podem ministrá-la. Somente através do quebrantamento deles é que a vida pode manifestar-se. Esse é o método perfeito de Deus. Que o Senhor derrube todo aquele que é orgulhoso; que Ele nos quebre, quebre e nos quebre de novo. Que Ele trate com toda a nossa vida natural. Que a cruz seja aplicada drástica e profundamente, a fim de que a vida seja ministrada aos ne­cessitados do Senhor.

 5 - O Quebrantamento Libera a Vida

Leitura: "O amor jamais acaba; mas, havendo profecias, desaparecerão; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, passará" (l Coríntios 13.8).
"Cresçamos em tudo Naquele que é a cabeça, Cristo, de quem todo o Corpo, bem ajustado e consolidado pelo auxílio de toda junta, segundo a justa cooperação de cada parte, efetua o seu próprio aumento para a edificação de si mesmo em amor" (Efésios 4.16).
"Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós. (...) Nossa leve e momentânea tribulação produz para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação, não atentando nós nas coisas que se vêem, mas nas que se não vêem (...) as que se não vêem são eternas" (2 Coríntios 47, 17,18).

Existem duas maneiras de servir o Corpo: uma, através do dom, é objetiva; e a outra, através da cruz, trabalhada, lavrada interiormente pelo Espírito, é subjetiva. Em algumas igrejas locais1, Deus precisa usar uma dessa maneiras e, em outras igrejas locais, Ele pode usar a outra. O dom espiritual pode ser chamado de "empréstimo Divino": o Senhor empresta Seu próprio poder e dons a você. Isso é algo realmente fora de você, separado de você. Tomemos Sansão como exemplo: ele podia fazer muitas coisas incomuns, coisas bem singulares e diferentes de todas as outras; todavia, o homem mesmo não era de modo algum incomum aos olhos de Deus. Deus simplesmente empresta Seu poder a pessoas comuns por algum tempo porque Ele tem uma necessidade especial, mas isso não significa que o indivíduo é uma pessoa de santidade ou de valor espiritual especial. Na verdade, mais tarde ele pode até dar provas de ser o contrário disso.

NÃO FAZER, MAS SER
Hoje a igreja organizada enfatiza o que a pessoa diz e o que faz, mas presta pouca atenção àquilo que a pessoa é. Muitos obreiros jovens desejam ardentemente falar com poder e elo­qüência, anseiam falar de forma brilhante a fim de mover e ajudar as pessoas. Eles falham em reconhecer que este não é o ponto vital. A questão vital é: quem e o que você é? O que tem valor, a questão de superior importância não é que você tenha recebido um dom e, por isso, seja capaz de falar, mas sim que você conhece o Senhor e, por isso, pode falar.
Não reunimos um grupo de jovens obreiros aqui[6] visando ensinar doutrinas e até mesmo a Bíblia a eles, ou para ensinar-lhes a pregar o evangelho ou a buscar dons e mesmo o poder, mas para ajudá-los a ser melhores homens e mulheres, aprender a cruz. Existem muitos lugares aos quais eles poderão ir em busca dos dons ou para aprender a pregar, mas não onde possam aprender a cruz. Se a esperança deles é adquirir mais conhecimento e dons a fim de ajudar os outros, então aqui[7] não é o lugar.
Os dons são necessários? Sim, eles são, até certo ponto. To­davia, não devem continuar além do ponto em que o Senhor busca interrompê-los para trazer a operação da cruz, o que­brantamento, o enfraquecimento e o conhecimento do Senhor - nesse sentido não precisamos de expressões sobrenaturais. Pelo fato de a boca falar do que está cheio o coração, e porque Cristo foi trabalhado interiormente pelo Espírito Santo que ha­bita interiormente, é que posso expressar a vida interior Dele. Podemos dizer hoje exatamente a mesma coisa que dissemos dez ou quinze anos atrás, mas será algo totalmente diferente. "Sim, eu conhecia e cria nestas coisas, mas agora elas foram interiormente trabalhadas no meu próprio ser. Sou eu, isto é, Cristo em mim."

O QUEBRANTAMENTO PRODUZ O MINISTÉRIO
Isaque representa aquele que tinha tudo por meio dos dons. Observe que tudo o que ele recebeu veio do seu pai. Era algo objetivo para ele, algo fora dele. Até mesmo quando Isaque abençoou os filhos, ele ficou bastante confuso, pois estava quase cego e confundiu os rapazes.
Não foi assim com Jacó, pois ele foi quebrado e realmente despedaçado pelo Senhor; e o Espírito de Deus trabalhou interiormente a própria vida de Deus nele, até que ele disse: "A Tua salvação espero, ó Senhor!" (Gn 49.18). Quando abençoou seus filhos, ou melhor, os filhos de José, Jacó sabia exatamente o que estava fazendo. Ele o fez com inteligência. Ele disse: "Eu sei, meu filho, eu o sei" (48.19). Jacó tinha luz, Jacó tinha revelação, porque havia sido quebrado.
Muitos perguntam: "Por que muitos servos bastante usados por Deus falham ou terminam sendo colocados de lado, isto é, não são mais usados por Ele?" Quem pode dizer que Deus já os havia usado? E se Ele usou, foi apenas concedendo os dons. Deus, em Seu direito soberano, escolheu alguém para lhe conceder um dom temporário, para ser usado por ele durante algum tempo, porque o homem não era interiormente digno de qualquer outro ministério.
"Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós" (2 Co 4.7). O Senhor nos conduz através de provas de fogo as quais não poderíamos suportar nem por elas passar, situações em que não seríamos vitoriosos e nas quais seríamos liquidados; todavia, é exatamente aí que descobrimos que aquilo que é precioso em nosso interior funciona. Por causa daquilo que é precioso dentro do vaso, por causa da vida de Cristo no interior, nós seguimos até o fim. Somos vitoriosos onde não poderíamos ser. Levamos no corpo o morrer de Jesus e, conseqüentemente, a vida de Jesus se torna manifesta.
Você só pode ajudar as pessoas na proporção em que você mesmo tenha sofrido. Quanto maior o preço pago, mais você pode ajudar os outros; quanto menor o preço, menos você pode ajudar os outros. A medida que você passa por provas de fogo, testes, aflições, perseguições e conflitos, e à medida que você permite ao Espírito Santo operar o morrer de Jesus em você, a vida, a vida de Cristo, fluíra para os outros.
6 - O Ministério Profético

Leitura: "Quanto a nós [os apóstolos,] nos consagraremos à oração e ao ministério da palavra" (Atos 6.4).
"A uns estabeleceu Deus na Igreja, primeiramente, após­tolos; em segundo lugar, profetas; em terceiro lugar, mes­tres; depois, operadores de milagres; depois, dons de curar, socorros, governos, variedades de línguas. Porventura, são todos apóstolos? Ou, todos profetas? São todos mestres? (...) Entretanto, procurai, com zelo, os melhores dons. (...) Ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres" (1 Coríntios 12.28-31; Efésios 4.11).
"Havia na igreja de Antioquia profetas e mestres: Barnabé, Simeão, por sobrenome Niger, Lúcio de Cirene, Manaém, colaço de Herodes, o tetrarca, e Saulo" (Atos 13.1).
"Segui o amor e procurai, com zelo, os dons espirituais, mas principalmente que profetizeis. Pois quem fala em outra
língua não fala a homens, senão a Deus, visto que ninguém o entende, e em espírito fala mistérios. Mas o que profetiza fala aos homens, edificando, exortando e consolando. O que fala em outra língua a si mesmo se edifica, mas o que profetiza edifica a igreja" (1 Coríntios 14.1-4).

Com relação aos dons, Deus enfatiza mais fortemente os dons de expressão, tais como profecia e ensino, do que os dons de ação, como curas e milagres. Como o apóstolo disse pelo Espírito: "Quanto a nós, nos consagraremos à oração e ao ministério da Palavra".
Existem dois tipos de dom para a Igreja: os dons de fatos, como milagres, curas, línguas, etc, e os dons de pessoas para ministrar, como profetas, os pastores e mestres e os evangelis­tas. Esses dons - de pessoas - têm relação com o ministério da Palavra de Deus.
Os dons de cura e milagres não nos dão mais da vida de Cristo interiormente. Eles atestam a Palavra de Deus, e isso é tudo; relacionam-se com questões exteriores e não interiores. O ministério da Palavra de Deus, entretanto, pelo dom de profetas, mestres e outros, edifica a vida espiritual interior da Igreja.

PROFETAS E MESTRES
Creio que o Senhor deseja que examinemos particularmente os ministérios de profeta e mestre. No Antigo Testamento, vemos dois tipos de profeta: os que predisseram acontecimen­tos futuros, como Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel, e outros, como Elias e Eliseu, dos quais a maior parte da obra não foi revelar acontecimentos futuros, mas explicar os de seu tempo. Eles deviam expressar qual era o pensamento de Deus em Seus atos naquele tempo, por que estava fazendo e o que estava fazendo. Eles deviam explicar as ações de Deus, por assim dizer, e, à luz do que Deus estava fazendo e do que estava em Sua mente, deviam exortar o povo. João Batista foi o mais proemi­nente desses profetas no Novo Testamento. Como outros antes dele, João expressou a mente atual de Deus. Desse modo, os profetas tinham um lugar distinto; ninguém poderia ser mais importante do que eles.
Os mestres, por sua vez, tomam a Palavra de Deus e a co­locam diante do povo, explicando-a. Eles nunca são mencio­nados sozinhos; geralmente são acompanhados pelos profetas ou pastores. Deus não designou os homens para serem apenas mestres. Deus não quer nenhuma doutrina ou ensinamento que tenha apenas valor acadêmico e não valor espiritual. Sim, Ele tem usado alguns como mestres, mas este é um ministério limitado, pois visa apenas a dar entendimento e luz na Palavra e ser capaz de passar isso claramente aos outros, partindo a Palavra em pedaços ou juntando suas partes num todo.
Tudo isso é objetivo; é um entendimento que veio do exterior, da Palavra, e não a luz que veio de um conhecimento real de Deus e de andar com Ele. Esse entendimento da Bíblia e a trans­missão dele conduz a muitas dificuldades mentais e a um estudo incessante visando a solução delas. Isso, porém, não é vida.
Mas haverá um dia quando o Senhor tomará você e lhe mostrará que o verdadeiro problema não é a Bíblia, mas você mesmo; que tudo o que você pesquisou e achou foi exterior, mental, sem valor, na esfera do conhecimento e não na esfera da vida.
Para que você seja um profeta, três coisas são necessárias e indispensáveis:
1.  A preparação como vaso: o Espírito quebrando você, tratando você, aplicando a cruz, levando-o à morte e operando dentro de você a vida de Cristo. Em outras palavras, uma história secreta com Deus.
2.  Um encargo interior, dado por Deus: um pensamento que se torna um encargo.
3.  Condições para expressar tal encargo, expressão para aquele pensamento: uma interpretação e expressão ní­tidas dele.
Existe o dom de profecia que pode se manifestar por meio de línguas ou declarações sobrenaturais, sob o Espírito derramado, mas isso é uma forma temporária de Deus agir quando não há ninguém com profundidade, história e maturidade espirituais a quem possa usar como vaso inteligente para a edificação da Igreja.

 7 - Ministrar em Vida

Leitura: "Pelo que, tendo este ministério, segundo a misericórdia que nos foi feita, não desfalecemos; pelo contrário, rejeitamos as coisas que, por vergonhosas, se ocultam, não andando com astúcia, nem adulterando a palavra de Deus; antes, nos recomendamos à consciência de todo homem, na presença de Deus, pela manifestação da verdade. (...) Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós. Em tudo somos atribulados, porém não angustiados; perplexos, porém não desanimados; perseguidos, porém não desamparados; abatidos, porém não destruídos; levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a sua vida se manifeste em nosso corpo. Porque nós, que vivemos, somos sempre entregues à morte por causa de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste em nossa carne mortal. De modo que, em nós, opera a morte, mas, em vós, a vida. (...) Por isso, não desanimamos; pelo contrário, mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, contudo, o nosso homem interior se renova de dia em dia" (2 Coríntios 4. 1,2, 7-12, 16).

A Segunda Carta aos Coríntios é um livro muito impor­tante, pois nos fala como deve ser a pessoa que serve a Deus. Por exemplo: os capítulos 8 e 9 nos falam, entre outras coisas, qual deve ser a atitude do servo do Senhor em relação ao dinheiro. Também vemos em 2 Coríntios o que significa ministrar em vida.
De todas as epístolas de Paulo, 1 Coríntios é a mais rasa e superficial, pois trata principalmente com o certo e o bom - por isso, não é tão profunda. Entretanto, 2 Coríntios é a mais profun­da de todas as epístolas (sem dúvida, Efésios é a mais elevada, mas 2 Coríntios é a mais profunda). Primeira Coríntios trata bastante de questões e problemas exteriores, mas no meio de tudo isso uma porção de realidades espirituais interiores vitais de grande preciosidade se destacam. Uma delas é que Deus escolheu as coisas fracas deste mundo, as desprezadas, as ignorantes e tolas, as que nada são e os que são nada, para envergonhar as sábias, a fim de que nenhuma carne se glorie aos Seus olhos. Outra coisa importante é que tudo o que temos recebemos de Deus, para que ninguém fique orgulhoso. Outro assunto de destaque é o comentário de Paulo sobre os vários dons e o valor deles. Além disso, ele traz o maravilhoso capítulo sobre o amor. Depois, no meio do capítulo que trata sobre o véu, Paulo nos dá o tremendo princípio de que a Igreja deve se colocar debaixo da autoridade conforme o arranjo de Deus: Cristo sob Deus, o homem sob Cristo e a mulher sob o homem. E, no início da carta, a grande questão da unidade é tratada, mostrando como toda a nossa unidade depende do tratamento drástico da carne.

ENSINOS BASEADOS NA VIDA
Embora tudo em 1 Coríntios seja simples, fácil de entender e não tão profundo, Deus planejou que esta não fosse a única carta escrita; Ele fez planos para que 2 Coríntios fosse acres­centada a ela. Na Segunda Carta vemos o tipo de pessoa que nos deu a Primeira, e é isso que dá a ela o seu valor. Primeira Coríntios é construída sobre a vida espiritual pessoal daquele que escreveu 2 Coríntios, e isso faz toda a diferença.
O ensino sobre dinheiro em 1 Coríntios só tem o devido valor por causa da própria atitude de Paulo em relação ao di­nheiro, manifestada em 2 Coríntios. Ele disse que nunca havia recebido dinheiro deles, mas havia trabalhado com as próprias mãos a fim de poupá-los, como faria uma mãe.
O ensinamento sobre a ressurreição em 1 Coríntios tem seu valor por ser uma experiência viva para ele. Ele conhecia a vida de ressurreição de Cristo nele mesmo, conforme sua declaração: "Também nós cremos; por isso, também falamos, sabendo que Aquele que ressuscitou o Senhor Jesus também nos ressuscitará com Jesus e nos apresentará convosco" (2 Co 4.13, 14). Em outro lugar, ele afirmou: "Já em nós mesmos tivemos a sentença de morte, para que não confiemos em nós e sim no Deus que ressuscita os mortos" (1.9), e "sabendo que, enquanto no corpo, estamos ausentes do Senhor (...) preferindo deixar o corpo e habitar com o Senhor" (2 Co 5.6, 8).
Tome também o ensinamento de Paulo sobre o amor. De todas as igrejas, a que estava em Corinto foi a mais rude de todas em seu tratamento com Paulo. Os crentes em Corinto o atacaram, interpretaram-no erradamente, tiveram pouca consi­deração para com ele, criticaram-no ferozmente, cometeram todo tipo de injustiça com ele e o feriram profundamente; todavia, em 2 Coríntios vemos como Paulo recebeu tudo com mansidão e graça. Ele disse: "Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai de misericórdias e Deus de toda consolação! É Ele que nos conforta em toda a nossa tribulação, para podermos consolar os que estiverem em qualquer angústia, com a consola­ção com que nós mesmos somos contemplados por Deus" (2 Co 1.3, 4). Ele reagiu com amor, não com repreensões, com terna compreensão e lágrimas, muitas orações e muito perdão.
Em 1 Coríntios Paulo nos mostra que Deus escolheu as coisas fracas, tolas e ignorantes, que ele, Paulo, é tão tolo e fraco como eles. Mas em 2 Coríntios ele diz: "Somos realmente fracos, totalmente fracos, mas existe algo em que se gloriar: Cristo em nós não é fraco. Ele é forte, Ele é poderoso, Ele é todo-suficiente". "Minha graça te basta", disse o Senhor a Pau­lo, "porque o poder se aperfeiçoa na fraqueza. De boa vontade, portanto", respondeu Paulo, "mais me gloriarei nas fraquezas para que sobre mim repouse o poder de Cristo" (12.9).
Paulo disse em 1 Coríntios que eles deviam estar dispostos a sofrer perdas nas questões financeiras, e para nunca irem ao tribunal, mas em 2 Coríntios ele se mostra como alguém que nunca se levanta pelos seus próprios direitos, mas aceita qualquer perda, pobreza ou prova que chegar a ele.

A CRUZ: A BASE DO MINISTÉRIO DE VIDA
A Segunda Carta aos Coríntios é, acima de tudo, um livro de sofrimento. Ali vemos o servo de Deus, Seu vaso escolhido, passando por terríveis provas de fogo e sofrendo como, talvez, nenhum outro apóstolo ou servo do Senhor jamais tenha expe­rimentado. O sofrimento está gravado no livro todo: sofrimento físico, mental e espiritual; alguns foram passageiros e outros permanentes. Mas ele mostra o motivo para esses sofrimentos ao dizer: "Levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a Sua vida se manifeste em nosso corpo" (4.10). Essa é a base de todo o ministério em vida. E preciso haver so­frimento e dor; é preciso haver a cruz, se a vida de Cristo tiver de ser manifestada. "De modo que, em nós, opera a morte, mas, em vós, a vida."
Sempre que houver um afastamento da cruz, uma fuga do Calvário, uma recusa do caminho da dor e do sofrimento, uma indisposição para pagar o preço e sofrer dor e perda, en­tão haverá pobreza, morte, superficialidade e vazio que nada nos dará para ministrarmos aos filhos de Deus. "Que a morte nunca cesse de operar em mim, para que a vida também nunca cesse de fluir para os outros."[8]
Qual é a explicação para a superficialidade e pobreza tão marcantes no ministério nestes dias? E porque os ministros mesmos experimentaram muito pouco. Eles deram um jeito de escapar da cruz sempre que Deus a ofereceu ou designou a eles. Sempre existe um meio de escape, outro caminho cujo preço não seja tão alto, um caminho inferior e não o caminho da cruz. Quão raros e poucos são os realmente ricos espiritualmente. E por quê? Porque seus sofrimentos não foram abundantes.
Os arranjos de Deus são perfeitos. Ele sabe que tipo de sofrimento cada um precisa: se é físico, material, mental ou espiritual. Quando Deus em Sua sabedoria os faz chegar a nós, porque vê que precisamos deles, regozijemo-nos e pro­curemos ver o Senhor neles. Vamos aceitá-los com alegria, reconhecendo que somos totalmente fracos e incapacitados para eles, mas que Ele é graciosamente capaz. Ele realmente é, e, na circunstância, nós O encontramos em Sua plenitude e suficiência. Conhecemos a Deus de forma real porque O en­contramos fazendo em nós e por nós o que não podemos fazer. Assim somos capacitados a ministrá-Lo em vida aos outros, a edificar o Corpo, a espalhar vida - Sua vida - aonde quer que formos. Sempre que a morte estiver realmente operando em nós, então, e só então, é que a vida pode verdadeiramente fluir para os outros.

















8 - Ministério Sacerdotal

Leitura: "Havia na igreja de Antioquia profetas e mestres: Barnabé, Simeão, por sobrenome Niger, Lúcio de Cirene, Manaém, colaço de Herodes, o tetrarca, e Saulo. E, servindo eles ao Senhor e jejuando, disse o Espírito Santo: Separai-me, agora, Barnabé e Saulo para a obra a que os tenho chamado" (Atos 13.1, 2).
"Coré, filho de Isar, filho de Coate, filho de Leví, tomou consi­go a Datã e a Abirão, filhos de Eliabe, e a Om, filho de Pelete, filhos de Rúben. Levantaram-se perante Moisés com duzentos e cinqüenta homens dos filhos de Israel, príncipes da congre­gação, eleitos por ela, varões de renome, e se ajuntaram contra Moisés e contra Arão e lhes disseram: Basta! Pois que toda a congregação é santa, cada um deles é santo, e o SENHOR está no meio deles; por que, pois, vos exaltais sobre a congre­gação do SENHOR? (...) Coré fez ajuntar contra eles todo o povo à porta da tenda da congregação; então, a glória do SENHOR apareceu a toda a congregação. Disse o SENHOR a Moisés e a Arão: Apartai-vos do meio desta congregação, e Os consumirei num momento. Mas eles se prostraram sobre o seu rosto e disseram: Ó Deus, Autor e Conservador de toda a vida, acaso, por pecar um só homem, indignar-te-ás contra esta congregação? (...) Eles e todos que lhes pertenciam desceram vivos ao abismo; a terra os cobriu, e pereceram do meio da congregação" (Números 16.1-3, 19-21, 33).
"A vara do homem que Eu escolher, essa florescerá; assim, farei cessar de sobre Mim as murmurações que os filhos de Israel proferem contra vós (...) No dia seguinte, Moisés entrou na tenda do Testemunho, e eis que a vara de Arão, pela casa de Leví, brotara, e, tendo inchado os gomos, produzira flores, e dava amêndoas. (...) Todo aquele que se aproximar do tabernáculo do SENHOR, morrerá; acaso expiraremos todos?" (Números 17.5, 8, 13).

Todos os que servem à Igreja servem, em primeiro lugar e antes de tudo, ao Senhor. Algumas vezes eles são chamados de ministros de Cristo e, outras, de ministros de Deus. Profetas e mestres são especialmente chamados de pessoas que servem ou ministram ao Senhor. Servir à Igreja ou ministrar ao povo é diferente de ministrar ao Senhor, e servir ao povo sem servir ao Senhor é relativamente de pouco valor para Deus. Freqüentemente existe a necessidade do evange­lho, de obreiros e de coisas assim; mas Deus também tem Sua necessidade. Se houver necessidade de obra ou de obreiros, e ela for satisfeita sem, todavia, ser um trabalho com Deus, a satisfação da necessidade de Deus ou um ministério ao Senhor em resposta à Sua necessidade e chamamento terá falhado.
Se houver ministério profético sem o ministério sacerdotal ao mesmo tempo, ele será sem valor e não poderá edificar a Igreja. Se minha mão esquerda quiser ajudar minha mão di­reita por estar ela ferida e doendo, minha mão esquerda não poderá ajudá-la diretamente. Ela terá que fazer isso através da cabeça. Ela só pode se comunicar com a outra mão por meio da cabeça. A mão esquerda vem em auxílio da outra mão não por si mesma, mas através da cabeça, isto é, para satisfazer a necessidade da cabeça. Portanto, qualquer ministério que não seja realizado por meio da Cabeça (Cristo) e para a Cabeça não tem valor e só nos leva a ter problemas com os outros membros.
Todo ministério que perdeu sua ênfase sacerdotal acima de todas as coisas já fracassou. Se alguém não foi à presença de Deus, em primeiro lugar, ele não pode sair da presença de Deus com qualquer mensagem ou serviço de valor. Se não ficamos na presença de Deus como sacerdotes, toda a nossa obra, testemunho, movimentação e esgotamento serão apenas um ministério ao homem e não ao Senhor.

A CHAMADA E A QUALIFICAÇÃO DO SACERDOTE
Que tipo de pessoa pode chegar a presença de Deus como sacerdote? Esse assunto é igual tanto no Antigo como no Novo Testamento. Devemos ser um reino de sacerdotes, reis e sacerdotes para Deus. Embora este seja o plano original de Deus, Israel falhou com respeito a ele. Quando Moisés desceu do Monte com os Dez Mandamentos, os israelitas já estavam adorando o bezerro de ouro. Então Deus disse: "Cada um cin-ja a espada sobre o lado, passai e tornai a passar pelo arraial de porta em porta, e mate cada um a seu irmão, cada um, a seu amigo, e cada um, a seu vizinho" (Êx 32.37). Entretanto, apenas os levitas obedeceram; e daquela ocasião em diante o ministério sacerdotal foi concedido a eles.
No caso dos filhos de Coré (Nm 16), o que estava em ques­tionamento era quem era santo e quem podia servir a Deus.
Eles reivindicaram que todos eram santos e todos podiam igual­mente servir a Deus. Mas Deus os julgou. A terra se abriu e engoliu todos os homens que pertenciam a Coré, junto com todos os seus bens, e fogo saiu de diante do Senhor e devo­rou os duzentos e cinqüenta homens que haviam oferecido incenso. Disso podemos ver que existe vida para aqueles que são designados por Deus para servi-Lo, mas para aqueles que não são chamados e, ainda assim, se apresentam e tentam servi-Lo por sua própria iniciativa, simplesmente porque assim desejam fazer ou por ser bom de ser feito, para eles há apenas destruição. Isso não é algo sem importância, sobre o qual Deus possa passar por cima; não, isso é algo grande: é uma questão de vida ou morte.
Ainda é verdade que todos os filhos de Deus são sacerdotes. Aleluia, ainda é verdade! Todavia, é igualmente verdadeiro que não podemos executar este oficio sem qualificações especiais. Não podemos exercitar nossa função designada como sacerdo­tes de acordo com o que naturalmente somos. Espiritualmente falando, apenas Moisés, Arão e os levitas podem executar esse ofício. Vemos esse princípio no caso de Coré, Datã e Abirão. Quando os duzentos e cinqüenta príncipes da congregação ofe­receram fogo falso nos incensários, eles foram consumidos.
Logo depois, a vara de Arão e as varas representativas das outras tribos foram colocadas no tabernáculo. No dia seguinte, apenas a vara de Arão floresceu. Isso, sem dúvida, significa ressurreição, a vida que sai da morte. Somente os que passaram pela morte e entraram na vida de ressurreição podem ministrar ao Senhor. Eles precisam conhecer a morte da cruz.
Não há possibilidade de você tomar algo da velha criação e colocar no tabernáculo, no ministério do Senhor: nem sua velha mente, sua inteligência ou seu talento, sua eloqüência ou qualquer tipo de força da velha criação. Tudo isso tem de ir direto para a morte e sair na vida de ressurreição. Se sua vara não florescer, você não pode servir a Deus. Resumindo, você não pode servir a Deus se conhece[9] apenas o sangue, mas não conhece9 a cruz.

DA MORTE PARA A VIDA
E verdade que, em posição, todos nós, cristãos, somos sa­cerdotes, mas é só depois que aceitamos a obra subjetiva da cruz e permitimos que nossa vida natural seja completa e ab­solutamente tratada que podemos desempenhar o ministério sacerdotal.
A ressurreição tem apenas um significado, este: a pessoa  pas­sou pela morte e recebeu nova vida. A ressurreição que vemos em Filipenses 3 é o aspecto positivo. Não se trata de algo que passa pela morte e sai vivo. Não, ressurreição é vida entrando na morte e emergindo em nova vida. Tudo o que é bom e ativo em nós, tudo o que vem do novo nascimento, a vida nascida de novo, pura e nova que Deus nos deu: tudo isso tem de descer à morte e passar pela morte, e ser purificado novamente pela morte, purificado três vezes pelos três dias (que tipificam ple­nitude, perfeição e inteireza da morte) e sair em vida. Isto é, de fato, vida de ressurreição: é a vida que, tendo passado pela morte - a morte que consome tudo o que essa vida reuniu do ego e do mundo , nunca mais pode ser tocada pela morte. Isso é a vida na qual não existe morte.
Tudo o que temos naturalmente como dons e tudo o que Deus nos deu como dons do Espírito deve passar pela morte. Se somos pessoas dotadas para conversar ou falar, podemos constatar o desaparecimento de tudo isso quando passamos pela morte. Pois, embora as conversações tenham sido boas, úteis e "espirituais", elas não vinham inteiramente do Espírito de Deus. Na verdade, era uma mistura e, por esta causa, será purificada ao passar pela morte. Nossa força e capacidade natu­ral nunca emergirão da morte. Todo o nosso poder intelectual precisa passar pela morte, caso contrário nunca poderá servir a Deus. E essa morte não é a morte de Romanos 6 e Gálatas 2.20; é algo além disso! Essa morte e ressurreição é a base, e a única base, para o ministério sacerdotal.
Graças a Deus, nós recusamos todo serviço que seja apenas ao homem. Não servimos ao homem, servimos a Deus, pois somos em primeiro lugar ministros de Cristo e, depois, do ho­mem, da Igreja. Mas a base de tudo isso é morte e ressurreição que resulta num ministério sacerdotal voltado para Deus, e depois no ministério ao homem. Que o Senhor nos conceda graça para entrarmos no Santo dos Santos, porque tudo o que é do ego e do homem, toda a mistura e tudo o que é da terra foi destruído na morte, enquanto o que é indestrutível e não pode morrer emergiu na vida de ressurreição.



9 - A Iniqüidade do Nosso Ministério

Leitura: "Quando chegaram à eira de Nacom, estendeu Uzá a mão à arca de Deus e a segurou, porque os bois tropeçaram. Então, a ira do SENHOR se acendeu contra Uzá, e Deus o feriu ali junto à arca de Deus (...) Temeu Davi ao SENHOR, naquele dia, e disse: Como virá a mim a arca do SENHOR?" (2 Samuel 6.6, 7, 9).
"O sacerdote Azarias (...) com oitenta sacerdotes do Se­nhor, homens da maior firmeza (...) resistiram ao rei Uzias e lhe disseram: A ti, Uzias, não compete queimar incenso perante o Senhor, mas aos sacerdotes, filhos de Arão, que são consagrados para este mister; sai do santuário, porque transgrediste; nem será isso para honra tua da parte do Se­nhor Deus. Então, Uzias se indignou; tinha o incensário na mão para queimar incenso; indignando-se ele, pois, contra os sacerdotes, a lepra lhe saiu na testa perante os sacerdo­tes, na Casa do Senhor, junto ao altar do incenso. Então, o sumo sacerdote Azarias e todos os sacerdotes voltaram-se para ele, e eis que estava leproso na testa, e apressadamente o lançaram fora; até ele mesmo se deu pressa em sair, visto que o Senhor o ferira. Assim, ficou leproso o rei Uzias até ao dia da sua morte; e morou, por ser leproso, numa casa separada, porque foi excluído da Casa do Senhor; e Jotão, seu filho, tinha a seu cargo a casa do rei, julgando o povo da terra" (2 Crônicas 26.18-21).
"Disse o Senhor a Arão: Tu, e teus filhos, e a casa de teu pai contigo levareis sobre vós a iniqüidade relativamente ao santuário; tu e teus filhos contigo levareis sobre vós a ini­qüidade relativamente ao vosso sacerdócio. Também farás chegar contigo a teus irmãos, a tribo de Leví, a tribo de teu pai, para que se ajuntem a ti e te sirvam, quando tu e teus filhos contigo estiverdes perante a tenda do Testemunho. Farão o serviço que lhes é devido para contigo e para com a tenda; porém não se aproximarão dos utensílios do san­tuário, nem do altar; para que não morram, nem eles, nem vós. Ajuntar-se-ão a ti e farão todo o serviço da tenda da congregação; o estranho, porém, não se chegará a vós outros. Vós, pois, fareis o serviço do santuário e o do altar, para que não haja outra vez ira sobre os filhos de Israel (...) Mas tu e teus filhos contigo atendereis ao vosso sacerdócio em tudo concernente ao altar, e ao que estiver para dentro do véu, isto é, vosso serviço; Eu vos tenho entregue o vosso sacerdócio por ofício como dádiva; porém o estranho que se aproximar morrerá. Disse mais o Senhor a Arão:Eis que Eu te dei o que foi separado das Minhas ofertas, com todas as coisas santificadas dos filhos de Israel; dei-as por direito perpétuo como porção a ti e a teus filhos" (Números 18.1-5, 7, 8).

Ministério sacerdotal no Antigo Testamento sempre significa ministério ao Senhor. Esse ministério é a base de todos os outros ministérios. Se alguém não tem esse ministério, todos os outros ministérios são vazios e inúteis, não podem agradar ao Senhor nem ser aceitos por Ele. No Novo Testamento, vemos que o ministério profético é o grande ministério. Mas aqui também notamos que esse ministério tem como base o ministério sacerdotal e, sem ele, o ministério profético se torna exterior e vazio, voltado apenas para o homem e não para o Senhor. Devemos observar que existem dois tipos de serviço: o serviço para Deus e o servi­ço a Deus. Nunca se esqueça disto: só o serviço a Ele Lhe é aceitável.


A INIQÜIDADE DO SANTUÁRIO
Deus disse a Arão: (1) "Tu, e teus filhos, e a casa de teu pai contigo levareis sobre vós a iniqüidade relativamente ao santuário"; (2) "[Eles (a tribo de Levi)] farão o serviço que lhes é devido (...) porém não se aproximarão dos utensílios do santuário, nem do altar"; (3) "O estranho, porém, não se chegará a vós."
Deus nos mostra muito claramente o que Ele pensa do pe­cado e passa por toda a lista; todavia, aqueles pecados não são punidos pela morte. Mas "a iniqüidade do santuário", a iniqüi­dade do ministério, só é punida com a morte, sem possibilidade de escape ou perdão. Esse tipo de iniqüidade, diferentemente de mentir ou matar, da soberba ou da quebra da lei de alguma forma, não é fácil de ser expiado. Esse pecado, a iniqüidade do ministério, não deve ser perdoado. Esse tipo de coisa simples­mente não deve ser permitido, tolerado ou perdoado. Qualquer outro pecado pode ser purificado e perdoado, mas este não.
O que são esses pecados do santuário? Precisamos voltar atrás e ver novamente o que é o ministério. Vimos que todo ministério é resultado de morte e ressurreição. A vara morta de Arão devia ser colocada diante de Deus e passar pela mor­te. A vara não tinha vida em si mesma, era uma coisa morta. Precisamos reconhecer que nós, como a vara, somos coisas mortas: inúteis, definitivamente inúteis, sem qualquer coisa para oferecer, sem esperança, sem o menor fragmento para oferecer a um mundo necessitado, sem um átomo de nada de valor para Deus ou que Ele possa usar.
Mas quando Deus tomou essa vara morta e a fez passar pela morte, ela brotou. Ela simplesmente tem de ser depositada diante do Senhor, para que Ele possa colocar Sua própria vida nela. No vaso de barro, Ele deposita aquele tesouro de grande valor: Sua própria vida que passou, ela mesma, pela morte e ressurreição. É a Sua morte e a Sua ressurreição que Ele nos leva a experimentar, como é mencionado em Filipenses 3. Por exemplo: tome alguém inteligente que tenta servir o Senhor com sua inteligência. Um ministério como este não resulta em vida. Pelo contrário, tudo o que ele toca resulta em morte porque ele mesmo não passou pela morte de Filipenses 3.
Qual é, então, a iniqüidade do santuário? E levar para o serviço do Senhor algo além da vida de ressurreição. Muitos são fervorosos pelo Senhor, mas apenas de forma natural; eles trazem seu próprio entusiasmo acalorado para o serviço ao Senhor. Isso é uma iniqüidade do santuário. Muitos servos de Deus trazem sua vontade forte para o serviço do Senhor. Isso é um pecado do santuário. Outros centralizam tudo na mente: a mente deles é clara e forte, e eles captam as coisas rapidamen­te; têm grande desejo de estar nos círculos espirituais e com pessoas espirituais e gostam de ouvir mensagens espirituais. Mas eles estão, por assim dizer, apenas assistindo tudo através de uma janela; aquilo nunca se tornou vida para eles. Deus nunca tocou verdadeiramente o espírito deles nem lhes deu revelação. Nunca passaram pela morte tudo o que neles é bom, forte e natural. Eles, pelo contrário, trazem a mente natural, talentos e tudo quanto é natural para o serviço de Deus. Isso é abominável para Ele e é o pecado do santuário.
A menos que nosso ministério seja aceitável a Deus, ele resulta em morte. Foi assim com Uzá quando estendeu a mão e tocou na arca de Deus, pois os bois que puxavam o carro novo sobre o qual ela estava tropeçaram e ela caía. Ele tocou o que era santo com mãos impuras e encontrou morte imediata. Em­bora fosse uma reação perfeitamente natural, não era, todavia, de acordo com a ordem de Deus. Era um serviço a Deus, mas contrário à norma de Deus, realizado à maneira do homem e na mente e força do homem. Muitas vezes estendemos a mão da carne e tentamos fazer aquilo que só Deus pode fazer. Nós falamos antes do tempo de Deus; não esperamos até que Ele realize as coisas no Seu próprio tempo e maneira e pelo Seu próprio Espírito. Tentamos fazer isso por Ele, mas o resultado é apenas morte - Deus pune tal coisa com morte.
O rei Uzias se atreveu a tomar sobre si aquilo que Deus havia designado apenas para os sacerdotes realizarem, isto é, queimar incenso a Deus. Deus respondeu imediatamente à sua atitude com a lepra: morte.
Da mesma forma, muitos hoje tentam ministrar no templo do Senhor quando, na verdade, Ele não os designou para isso. Eles querem servir ao Senhor, amam a obra cristã, encontram grande alegria nela, movimentam-se numa atividade incessante pelo Senhor, fazem sacrifícios por Ele e comem muitas coisas amargas na obra por Ele: isso pode estar errado? Deus diz que é a iniqüidade do santuário por não ter sido designado por Ele. Ele não chamou tais pessoas para realizar isso. Tal obra é feita na força do homem e não na força de Deus ou, então, essa obra nunca conheceu a cruz nem passou pela morte. A confiança em qualquer coisa da velha criação e a introdução delas na obra do Senhor - coisas tais como eloqüência, inteligência, bondade, capacidade e outras -, constituem a iniqüidade do ministério. Qualquer dependência da força própria de alguém para servir ao Senhor é um pecado do santuário.

DE DEUS PARA DEUS
Só podemos servir a Deus com aquilo que é de Deus. Nada a não ser aquilo que procede de Deus pode ser usado no serviço a Ele. Podemos ter reuniões anima­das em que as emoções são despertadas, mas isso pode estar totalmente no plano natural e provará ser madeira, feno e palha e nunca passará pelo fogo. Podemos até mesmo olhar para trás e louvar ao Senhor por todas as bênçãos que Ele nos permitiu ver, as quais foram concedidas aos outros no passado, mas se tal ministério não teve como base a morte e a ressurreição de Filipenses 3, ele nunca permanecerá ao passar pelo fogo.
Você precisa estar tão morto quanto a vara colocada diante do Senhor durante uma noite. Durante uma noite e não por dez minutos. Muitos de nós emergimos muito cedo. Deus nos faz deitar, mas nós deveríamos levantar somente pela manhã. Todos devem passar por esse período de morte. Tal período de morte pode durar meses ou ser até mais longo. Qual é o resultado? Nosso ministério se vai, nossa riqueza espiritual é tirada; tudo o que possuíamos e nos levava a regozijar-nos, tudo o que conhecíamos e experimentávamos foi removido; nossa vida de oração cessou e nosso testemunho foi tirado. De fato, tudo parece ser trevas e morte. Entretanto, estamos nas mãos de Deus, deitados diante Dele no santuário. Rejei­tamos olhar para dentro de nós mesmos e nos examinar para ver onde estamos, no sentido de distinguir o que é o ego e o que é Deus, o que é alma e o que é espírito, pois tudo o que está dentro de nós é e será sempre trevas. Assim, decidimos simplesmente manter os olhos fitos no Senhor. Sabemos que a manhã da ressurreição virá, mas retiramos as mãos da obra e deixamos o Senhor realizar Sua obra perfeita durante toda essa noite de morte para todas as coisas.
Toda obra [para Deus] deve ser um serviço a Deus. Se es­tamos servindo a Deus, se estamos testemunhando para Ele, então somos verdadeiramente sacerdotes.


[1] Considerando do ponto de vista do tempo, da limitação do homem, o autor se refere à eternidade passada, antes do início do tempo, antes do início da criação de Deus, e à eternidade futura, no novo céu e nova terra. (N.E.)

[2] Deus, em Sua soberania, pode usar tais obreiros, obras ou missões, mas isso não prova que estejam de acordo com a ordem de Deus. (N.E. em inglês)

[3] O mesmo vale para cada cidade do planeta. (N.E.)

[4] Parece-nos que o autor quer significar que se vivermos, de fato, o Corpo como nossa vida, nele encontraremos as respostas que, sozinhos, não conseguimos encontrar. (N.E.)

[5] O Espírito derramado refere-se ao revestimento exterior do Espírito, em seu aspecto de poder, de capacitação para a obra, como o ocorrido no dia de Pentecoste, não em seu sentido de vida, de regeneração, como o registrado em João 20. (N.E.) 2Berçário, no original. (N.E.)

[6] A expressão "igreja local" não é um nome próprio nem se refere a uma congregação de determinada denominação ou grupo cristão, mas indica simplesmente a igreja em uma cidade, como a igreja em Jerusalém ou a igreja em Corinto. (N.E.) ²Provavelmente este fosse o público específico para o qual esta conferência foi dada. (N.E.)

[7] Referindo-se à conferência. (N.E.)

[8] Palavras de despedida do irmão Nee, quando seu navio partiu de Xangai para a Inglaterra em 1938. (N.E. em inglês)

[9] Conhecer aqui, como já exposto pelo autor, não se refere a conhecimento doutrinário, mental, mas ao conhecimento advindo da experiência e do relacionamento com Deus e manifestado na vida diária. (N.E.)